quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

José Ilídio Torres escreveu O Diário de Maria Cura

 
 
 
O mistério.
Na contracapa está escrito que o romance rompe “com todas as convenções estabelecidas.” Acho que não.
Depois de Anais Nin, Henry Miller, Tom Wolfe, Bukowski (é um exemplo tão estafado mas gosto de o utilizar) ou do enlouquecido Hunter S.Thompson dificilmente existem convenções em pé.
Cá (nesta terra bela) é diferente, de facto.
Mas essa não é a qualidade entre qualidades do romance de José Torres.
A técnica descritiva e narrativa utilizada pelo autor, não “rompe” convenções. Mas mantêm-se firme.
A história desta mulher, começa pela descoberta do sexo e tende a esgotar um certo voyerismo descritivo nas primeiras vinte páginas, após a descrição de encontros e desencontros, tornando o resto da narrativa algo previsível.
E o autor brinca com o leitor. O autor é quem trabalha. Dá voltas à história acrescentando roupa à nudez e luta para prender o leitor.
O romance passa então, conforme a promessa do primeiro capítulo, para o domínio do policial. Eu diria, como um bom policial e penso em Raymond Chandler e James Ellroy (dois casos brilhantes), não se resume aos pormenores de polícia e da investigação.
Algures por aqui, começo a acreditar em José Torres como escritor, dono de um domínio da linguagem muito particular e criativa, porque acabo por o esquecer, fica apenas eu e a história. Olho para a capa. Devia ser outra capa. Mais viva. Cores mais berrantes e apelativas.
Volto ao romance. Fez bem em publicar este romance. Que parta dele para o infinito. Pode fazê-lo, se o quiser. Não faça como os outros, mesmo os bons. Faça melhor. É capaz. Bela região onde mora. Minho. Tanto para contar. De certeza que o têm. Vá longe. Liberte a verdadeira voz, dentro de si. Assuma-se como autor.
O Lobo Antunes, tem uma máxima: quer pôr tudo no livro que está a escrever. Esforça-se o homem. E nota-se na sua literatura. Eu não sei se ele é mesmo o melhor escritor vivo, mas é de certeza, um deles. E Saramago é brilhante. Fizeram pela Língua Portuguesa algo que nunca lhes vamos agradecer convenientemente. São os nossos professores, falando nos vivos.
Apenas citei estes, os mais falados, gosto de outros. Por exemplo, Herberto dominou a poesia deste país, quase esgotando-a, deixando o trabalho para os seguintes, verdadeiramente complicado. É só para falar nele. Já é uma moda fazê-lo. E fica muito bem. Dá um ar distinto a quem fala de Herberto. Brinco.
Faça o que se prometeu na contra-capa, rompa com as convenções estabelecidas. Fico à espera do seguinte.
Um grande abraço deste leitor já cativado. Falo como leitor e amigo (dentro do que é possível, nestas circunstâncias), embora escreva, sou mais leitor do que autor. Como leitor, sei por onde ando, como um miúdo guloso numa loja de doces, a absorver tudo. Como autor, Meu Deus, completamente perdido. Portanto, este é um texto dum leitor, apenas.
Ah, quanto ao mistério de Maria Cura, sempre o será e este é a maior qualidade do livro. Deixá-lo viver depois de o lermos. Aqui José Torres, tem o segredo dos grandes autores na mão. Saiba usá-lo.

Ou seja, gostei e uma pequena grande lição de como escrever.

Parabéns a José Torres e à editora. Recomendo.

Jul. 09



Criado em: 15/12/2011 12:57

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Carlos Teixeira Luis

http://carlosteixeiraluis.blogspot.com

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